terça-feira, 8 de dezembro de 2015

O Globo - Enquanto governo parcela salários, TJ, MP e TCE aumentam despesas


Enquanto governo parcela salários, TJ, MP e TCE aumentam despesas

MP gastou R$ 81 milhões a mais que em 2014. No TJ, R$ 134 milhões. TCE, R$ 7,2 milhões


RIO - A crise econômica que levou o governo do estado à penúria não atinge igualmente todos os poderes e órgãos públicos. Enquanto o Executivo parcela salário de servidores e tem até telefones cortados por falta de pagamento, o Ministério Público (MP), o Tribunal de Contas do Estado (TCE) e o Tribunal de Justiça (TJ) aumentaram suas despesas de custeio este ano em R$ 222 milhões. Esses gastos, que excluem as despesas de pessoal, compreendem diárias, passagens, auxílio-moradia, carro, motorista e contratos de serviços terceirizados, entre outros itens. O valor é quase o dobro do necessário para quitar os R$ 113 milhões de dívidas da Uerj, que vive a maior crise de sua história. Somente R$ 8,3 milhões já seriam suficientes, por exemplo, para colocar em dia o pagamento dos bolsistas de iniciação científica, cotistas e médicos residentes do Hospital Universitário Pedro Ernesto.

Um levantamento feito no Sistema de Acompanhamento Financeiro do Estado (Siafem), a pedido do GLOBO, revela que, de janeiro a outubro deste ano, o MP gastou R$ 81 milhões a mais do que no mesmo período do ano passado — o salto foi de R$ 169,9 milhões para R$ 251,5 milhões (48%). No TJ, foram R$ 134 milhões a mais este ano (um acréscimo de 16%). No TCE, mais R$ 7,2 milhões (um crescimento de 15%).
ALERJ MANTÉM GASTOS COM GASOLINA
A exceção foi a Alerj, que reduziu em 10% o previsto para custeio. No entanto, mantém gastos anuais com gasolina para os carros de cada um dos 70 deputados que somam R$ 2,4 milhões. Com esse valor, daria para comprar 660 mil litros de gasolina — considerando o preço médio de R$ 3,78 no Rio —, combustível suficiente para percorrer 16 vezes uma distância equivalente à existente entre a Terra e a Lua. Este ano, a Casa criou pelo menos 61 cargos comissionados, além de ter renovado a frota de 20 veículos de luxo ao custo de R$ 1,2 milhão. A Alerj, no entanto, alega que fez cortes que levaram a uma economia total de R$ 128,6 milhões. Frisa ainda que essa economia permitiu doar mais de R$ 35 milhões a diferentes órgãos do estado.

O MP informou que houve crescimento nos valores de custeio por causa de uma mudança contábil determinada por um decreto estadual. Segundo o órgão, até o ano passado, gastos de R$ 46 milhões com serviços de manutenção — que deveriam ser considerados como de custeio — eram contabilizados como despesas de pessoal. No MP, promotores e procuradores, que ganham salários de R$ 27,5 mil a R$ 30,4 mil, recebem até R$ 4,7 mil de auxílio-moradia. Só esse benefício já custou R$ 36 milhões ao erário até outubro passado, segundo o Portal da Transparência do órgão. O Ministério Público também gastou, no mesmo período, R$ 1,25 milhão com 290 vagas de estacionamento no Centro.
A página lista ainda outras despesas de custeio do órgão, como o auxílio-transporte, que consumiu R$ 14 milhões este ano. Com um contrato de “serviços de motoristas”, por exemplo, foram gastos até outubro R$ 2,1 milhões. Há ainda duas contratações de “serviços de recepção, ascensoramento, garçom, telefonista e operadora de copiadora”, que totalizam R$ 7,1 milhões já pagos. Além disso, despesas com diárias no país e no exterior chegam a R$ 565,5 mil.
No TJ, os magistrados, que recebem salário de cerca de R$ 30 mil, têm carro e motorista à disposição, recebendo ainda auxílio para creche e alimentação. Além disso, todo mês, os juízes, independentemente de onde moram e trabalham, ganham R$ 4.300 de auxílio-moradia. Os benefícios pesam na despesa de custeio. Em maio, servidores, juízes e desembargadores do tribunal ainda conquistaram mais uma vantagem em plena crise: a aprovação do auxílio-educação de até R$ 2,8 mil pela Alerj. O impacto da medida será de R$ 130 milhões no ano que vem. De acordo com o Portal Transparência do tribunal, os auxílios para creche, alimentação e transporte consumiram R$ 195 milhões este ano.

Em nota, o TJ frisou que as despesas de custeio do Poder Judiciário “são obrigações, em regra, reajustadas pelo IPCA, cuja variação foi de 10,75% (outubro/2014 a outubro/2015)”. Sendo assim, diz o tribunal, “o crescimento real foi de cerca de 5% e corresponde ao crescimento da demanda jurisdicional, que foi de 3,5%” entre janeiro e outubro. Ainda segundo o TJ, os recursos vêm do estado, conforme determina a Constituição Federal.
Já o presidente do TCE, Jonas Lopes, minimizou o aumento dos gastos com custeio. Segundo ele, somente com a revogação de editais de licitação nos quais o tribunal determinou correções desde 2011, por suspeitas de superfaturamento, o estado já teria economizado mais de R$ 3 bilhões.
ESPECIALISTA: TODOS TÊM QUE ECONOMIZAR
O especialista em tributação e finanças públicas Paulo Corval lembra que, por uma questão de autonomia dos poderes, o Executivo não pode contingenciar os gastos do Judiciário e do Legislativo. Contudo, ressalta a importância de uma integração maior entre o os órgãos, para a redução das despesas:
— A sociedade precisa ver um esforço de todos os setores da administração pública. Ela não pode ser convidada a fazer um esforço, tendo seus salários parcelados, se aqueles investidos dos cargos mais importantes não mostrarem que estão em sintonia num momento tão grave.
Presidente da Comissão de Orçamento da Alerj, o deputado Pedro Fernandes (PMDB) defende a redução dos gastos no TJ, MP e TCE:
— Estou sugerindo ao governador (Luiz Fernando Pezão) chamar os poderes (Judiciário e Legislativo) para discutirmos uma redução do custeio. Temos que reduzir em todos os órgãos. Não é porque eles têm um orçamento garantido que vão simplesmente gastar de forma descontrolada num contexto de crise, mesmo que estejam cumprindo seus limites constitucionais.
Para o economista Mauro Osorio, da UFRJ, é preciso ampliar o debate sobre a redução dos gastos nos poderes Judiciário e Legislativo:

— Embora não se deva demonizar o custeio, num momento como este de dificuldade do estado, é preciso avaliar quais são as prioridades e ver onde há desperdício.
O sociólogo Paulo Baía, da UFRJ, destaca a importância da redução do custeio em todos os poderes:
— O esforço de arrecadação e de redução de gastos tem que ser feito por todos. O servidor público estadual do Poder Executivo se sente prejudicado por ter seus salários parcelados, enquanto seus colegas dos demais poderes não passam a mesma dificuldade, embora a fonte de arrecadação seja a mesma.

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